sábado, 26 de janeiro de 2013

MEU AMOR ME TRAIU, E AGORA?



O caminho é a felicidade ou a felicidade é o caminho? Essa é a frase que dá início ao filme brasileiro "Onde está a felicidade?" (2011). A história é leve e com alguns clichês, mas levanta um debate importante sobre a traição.

Gosto de filmes que retratam conflitos de casais, pois costumam refletir bem a realidade da vida a dois (tirando os finais sempre felizes, é claro). No filme, Teodora, interpretada por Bruna Lombardi, sente-se traída pelo marido Nando (Bruno Garcia), após ver uma mulher o seduzindo pela webcam do computador. O homem diz à esposa que nunca encontrou sua parceira virtual e que, portanto, aquilo não poderia ser considerado uma traição. Então, chegamos a um assunto corriqueiro atualmente, a infidelidade virtual.

A interpretação de Nando é pessoal e intransferível. Afinal, só quem vivencia essa experiência pode afirmar se houve infidelidade. Mas em uma situação como essa eu prefiro olhar para o todo. O filme não aprofunda o assunto, mas seria interessante entender os motivos que levaram Nando a conhecer a mulher virtual. O que ocorria no casamento e o que deixava de acontecer? Aparentemente, os personagens, casados há 11 anos, eram apenas diferentes em alguns comportamentos do dia a dia, assim como outros diversos casais. Ele ama futebol, ela gosta de cozinhar. Ele é bagunceiro e ela extremamente organizada. Mas essas diferenças não são suficientes para levar à traição.

É POSSÍVEL PERDOAR UMA TRAIÇÃO?

Penso que a infidelidade é derivada de uma crise conjugal. E como qualquer crise, pode ou não ser superada. Isso depende da maturidade do casal e do relacionamento existente entre eles. Mas passar por uma crise requer mudança de ambos os lados. Infelizmente é comum que a pessoa que se sente vitimada (geralmente quem é traído) não esteja disposta a aceitar a sua responsabilidade na traição. Mas não há vitimas e algozes em relações amorosas. Ambos contribuem para a evolução do relacionamento. Algumas vezes a "vítima" não tem a consciência de que algum comportamento seu pode ter influenciado a atitude de seu suposto "algoz". Mas o casal alimenta os papéis um do outro todo o tempo e, em alguns casos, por toda vida.

O que fazer então? Um bom terapeuta de casal pode resolver. Mas se o casal conseguir retomar o diálogo e esclarecer os pontos obscuros da relação, já é um ótimo começo. O problema é que na maioria das vezes as pessoas apenas pensam que resolveram a situação, mas a cada nova discussão ou crise no relacionamento (porque elas irão ocorrer) o tal assunto volta à tona.

APRENDENDO A REGAR SUA RELAÇÃO

Certa vez tive o privilégio de assistir uma palestra com o Carlos Arturo Molina, escritor na área de Psicologia Familiar e de Casal, na qual ele mencionou este assunto. Achei brilhante uma tarefa que ele deu a um casal que passava por tal situação. O especialista disse que ambos teriam que enterrar aquele assunto de uma vez por todas. E como procuraram a terapia, é porque estavam mesmo decididos a melhorar a relação. O casal aceitou a proposta e tiveram que fazer um acordo por escrito, afirmando que qualquer crise conjugal, dali por diante, deveria ser resolvida no prazo de um ano. O mesmo problema não poderia nunca estar presente em novas discussões no futuro, sob pena de pagamento de alguma multa simbólica estabelecida por ambos. Assim, o casal pode escolher que a felicidade de um não dependeria do outro, mas sim do esforço de cada um estar presente no relacionamento, construindo com respeito, amor e diálogo uma relação madura e preparada para enfrentar as crises.

Termino com uma frase do personagem Nando, citada no final do filme: "o amor é como a caatinga: quando tudo parece estar seco e morrendo, de repente vem a chuva e tudo floresce novamente". Casais que ainda acreditam em seu relacionamento precisam aprender a fazer chover!

Texto originalmente publicado em Personare.

terça-feira, 8 de janeiro de 2013

A AUSÊNCIA DA PRESENÇA



A leitura do livro Autoridade sem Violência: O resgate da voz dos pais me propiciou muitas reflexões como Psicóloga e como Mãe! Um livro que eu nunca tinha ouvido falar e talvez não pensasse que seria tão relevante. Mas o prefácio de Carlos Arturo Molina-Loza, um autor sistêmico o qual sou fã, me animou em adquiri-lo numa troca de presentes. O livro de Haim Omer, é pequeno, simples e ao mesmo tempo, objetivo e profundo. Ganhou-me já nas primeiras páginas nas quais o autor descreveu ligeiramente três abordagens da psicologia, a sistêmica, a humanista e a comportamental e explicou que queria unir o que cada uma tinha de melhor para auxiliar na clínica com pais e filhos. O autor então descreve no decorrer do seu livro algumas manifestações da presença parental, sempre exemplificando com seus casos interessantes.

O assunto é simples. É possível ser presente e ter autoridade com os filhos, sem utilizar a violência para conseguir isso. Simples e complexo ao mesmo tempo. Se pensarmos em problemas do cotidiano, como uma birra ou teimosia, pode até ser mais fácil, mas problemas de utilização de drogas, violência com os pais e até autoextermínio são bemmmmm mais complexos.

Ser presente é bem mais complexo que podemos imaginar. É estar ali para aquela pessoa, denominada filho (a), e respeitá-la, amá-la, educá-la e discipliná-la. E isso nada tem a ver com a quantidade de tempo ao lado deste filho (a), mas com a qualidade é claro. Muitos pais acabam ligando o piloto automático e vão apenas cumprindo papéis para que nada falte ao filho em termos materiais, e como não estão lhe dando com objetos, mais cedo ou mais tarde eles perdem a voz e os filhos acabam estabelecendo-se como autoridades máximas no lar. Esse resgate no qual o autor fala pode ser difícil, mas não é impossível, e requer trabalho e comprometimento.

As vezes criamos expectativas irreais e nos afundamos em frustrações. Mas não criar nenhuma expectativa também não é o caminho. Como escreve OMER (2011):

Evidentemente que algumas crianças sofrem com as expectativas excessivamente rígidas dos pais. No entanto, será que outros também não sofrem pela falta de expectativas? Nas famílias que estamos estudando, a resposta é claramente positiva. Os pais que estamos ajudando sentem-se tão inseguros que não se atrevem nem mesmo a esperar algo de seus filhos. Parece que eles consideram a esperança como um perigoso micróbio: esperar significaria tenta, tentar significaria exigir, e exigir significaria naufragar num mar de brigas. Ouvimos, entretanto, muitas queixas tardias dessas crianças contra seus pais: “Você nem sequer sonhou que mim sairia algo de bom!” (pag.34)

Outro erro comum que nós temos é os sermões sem fim. Palavras não significam presença, pelo contrário, podem significar ausência. É o Blábláblá do qual os filhos reclamam e debocham muitas vezes. Substituir as palavras vazias por atos podem provar aos filhos que eles não estão sozinhos pois aí sim há a presença parental.

E a danada da culpa. Essa sim merecia um livro a parte. Quanta coisa fazemos ou deixamos de fazer aos nossos filhos, por causa dela. São aqueles pais que acabam permitindo que o filho faça tudo, pois acredita que assim o deixará feliz e não terá culpa de nada. Como coloca o autor:

Nos pais, o sentimento de culpa alimenta o de pena e ambos garantem um suprimento contínuo de ansiedade. E os três podem reduzir até a voz pessoal mais vibrante a um inexpressivo sussurro. (...) A pena é muito diferente do amor maduro. Para que amemos nossos filhos como pessoas (e não apenas como objeto de nosso sentimentalismo), precisamos nos sobrepor à pena que sentíamos de nossos filhos quando eles ainda eram pequenos e incapazes. (pág.78)

Então, deixar tudo, ter pena, sentir culpa nada tem a ver com amor. Os filhos precisam de nossa voz, nossa presença efetiva. Isso é feito com atitude, atos de amor.

E principalmente, não precisamos conseguir tudo sozinhos. Pedir ajuda a um psicólogo não é sinal de fraqueza na educação dos filhos (ou em qualquer outra situação). Pelo contrário. É o reconhecimento de que podemos fazer mais, só que ainda não descobrimos como. E um terceiro pode nos ajudar a ver, olhar pra dentro.

A capacidade de reconhecer um erro e de mudar o rumo não é sinal de fraqueza ou de falta de determinação. Ao contrário, a pessoa com falta de confiança própria é que, frequentemente, sente-se ameaçada por mudanças de roteiro. Em nossa experiência, os pais são particularmente inflexíveis no princípio do processo terapêutico, quando ainda se sentem inseguros. À medida que vão ficando temperados pela empreitada, eles se tornam mais flexíveis e sentem-se mais capazes de reconhecer erros e abandonar exigências demasiadamente rígidas. (pág.92)

OMER, Haim. Autoridade sem violência: o resgate da voz dos pais. Belo Horizonte: Artesã, 2011. P.92